terça-feira, 6 de novembro de 2012

Oito décadas do nosso “menino sorriso”

Texto escrito em 3 de maio de 2011

Entre um relatório e outro, atendimento a aluno, conversas ao telefone, hoje passei por momentos de reflexão sobre a vida. Ou melhor, sobre como levar a vida. Fiquei refletindo sobre o decorrer dos anos, sobre como as pessoas valorizam ou desvalorizam cada momento de sua existência. E quem me fez pensar em tudo isso foi meu pai. Hoje o velho completa 80 anos de vida. Já nesta quinta linha, em minha sala no trabalho, tenho que segurar minhas lágrimas de emoção ao me lembrar de alguns detalhes da convivência com ele.

Sou uma privilegiada mesmo. Agradeço a cada dia pelo prazer de compartilhar as minhas alegrias, as minhas angústias, os meus pensamentos com esse homem que me passa diariamente uma lição de garra e alegria de viver. O menino “oitentão” não gosta de falar sobre idade. Nem mesmo permite que comemoremos a data com a pompa e circunstância que merece. É discreto. Prefere ficar quieto neste dia e que ninguém saiba, além da família.

Para ele, hoje é um dia normal como tantos outros. Acordou cedinho, buscou o pão para a minha mãe. Fez o café como de costume e foi trabalhar. Isso mesmo. O velho ainda trabalha. E diz que isso é saúde. Alguém duvida? Trabalha mais de oito horas por dia, dirige na cidade e na estrada, joga bocha todo final de semana no clube Mangueiras. E aí de quem demonstra cansaço perto dele! Fica bravo.

O menino de Laranjal (MG) ainda conserva o sorriso largo e sincero de quem já morou na Fazenda do Cristal. Ele tirava o leite, tratava do gado, subia e descia morro e ajudava aos irmãos na labuta.

O meu velho perdeu o seu pai ainda criança. Aos oito anos teve que aprender a lidar com a perda e a responsabilidade cresceu. Dez irmãos para a minha avó Maria tratar na roça. As dificuldades foram muitas. O jeito era ir para a Cidade Grande tentar a vida.

E assim o meu paizão fez. Foi para o Rio de Janeiro ainda mocinho para morar com o meu saudoso tio Dejair, já casado na época. Lá arranjou emprego, fez cursos e aprendeu o ofício da refrigeração. Lá se passaram 30 anos. Uma vida. O menino da roça aprendeu com os desafios da Cidade Maravilhosa! As décadas eram de 50 e 60. Outra realidade! Um Rio de Janeiro da Bossa Nova, dos boêmios da Lapa e também da Praça Sans Penha, na Tijuca, onde ele freqüentava.

Mas nunca foi boêmio. Pelo contrário, sempre foi homem do dia. Gosta de dormir cedo e adepto do ditado de que “Deus ajuda a quem cedo madruga”. Não me lembro de ter presenciado meu pai passar das seis da manhã na cama, mesmo nos finais de semana e feriados.

Certa vez meus tios Dejair e Beatriz receberam a notícia de que receberiam a visita de duas primas de Minas: uma de Ubá e outra de Cataguases. Meu pai ainda morava na casa deles nesta época. Apesar do parentesco, ele não as conhecia. Dessa visita começou um namoro com minha mãe. Desse namoro veio o casamento cinco anos depois. E a vinda deles para Ubá um ano depois de casados.

Eles vieram para Ubá na década de 60 e nunca mais saíram daqui. Meu pai aprendeu a amar essa cidade em função do amor dele por minha mãe. Hoje ele é muito mais conhecido do que ela por aqui. Quem não conhece do seu Almir da geladeira? Apesar do pouco estudo, ele pôde nos dar a oportunidade de estudar e criou nossa família dignamente. Hoje tentamos nos espelhar em seu caráter. Somos três filhos e duas netas lindas.

Continuamos aprendendo com ele a cada dia. Ele nos estimula a dar valor a cada dia de nossas vidas. Sua saúde de ferro, seu vigor, sua vontade de sempre estar bem informado e sua alegria a cada gol do Flamengo nos fazem sentir que vale a pena aproveitar cada instante de nossa existência sem mágoas, sem rancor.

O importante é ter ao nosso lado quem amamos e valorizarmos o nosso trabalho e respeitar as pessoas que nos rodeiam.

Um comentário:

ANTONIO CARLOS ESTEVAM disse...

Jornalista Taís Alves: Li, com a devida atenção, e reli. Fica fácil entender porque esse octogenário, que é o técnico em refrigeração Almir Alves - sem o pretender, eis que ele é a personificação da simplicidade - transpira felicidade, trazendo em seu seu rosto estampada, sempre, a alegria de viver. Deve ser muito bom ser pai assim, hein, sô Almir! Bjin aí na netinha dele, Taís e José Carlos. Parabéns pelo quanto bem expressa teu sentimento relacionado com esse ente tão querido, o teu pai.